segunda-feira, 21 de junho de 2010

Em memória

- Engraçado. É engraçado como só agora que não vou mais poder te ver, lembro do quanto sinto tua falta. Passo a remoer tudo o que passamos, as maluquices, os limites que tentamos alcançar, mesmo quando distantes, fazíamos alguma merda pensando no que o outro seria capaz se na mesma situação. – ele disse a si mesmo enquanto via fotos antigas, algumas amassadas, que haviam sido esquecidas em um canto qualquer. Mal lembrava-se da amiga com a qual passara quatro anos intensos, dos quais quase não lembrava, graças à abençoada amnésia alcoólica. E, que anos depois, não repetindo nada próximo daquilo mantinha-se orgulhoso de tudo o que não fazia ideia do que havia feito.

- Desculpa não avisar, não queria você preocupado. – imaginou a amiga dizer – E, acima de tudo, não queria te dar a chance de dizer "eu avisei".

- Foda-se. Estar ao seu lado nesse momento era mais importante do que qualquer disputa de egos que nós tivéssemos. Só diria "eu avisei" quando se recuperasse.

- Então vai guardar isso entalado na garganta a vida inteira?

- Isso não é hora, Lu. Eu sequer vou ser capaz de me despedir, queria ao menos poder fazer isso. – lágrimas teimavam em encontrar seu caminho.

- Pensa comigo, cabeça: Ia basicamente largar o trabalho pelo qual só não deu seu fígado porque ele ainda não tava inteiro o suficiente e, também, ia me ver aos pedaços. A bunda da qual tanto gostava não ia ter nem sinal do que já chegou a ser. Convenhamos, seria broxante.

- Não interessa, é minha amiga, eu sempre insisti pra que largasse essa porra de cigarro, mas nunca parou. Eu tinha o direito de saber que isso tava te matando. – uma vontade súbita de abraçar o tomou, o desejo de adeus tornou-se físico.

- E eu tinha o direito de não te dizer nada e deixar com que seguisse sua vida. – ele sentiu a vontade dela, por mais esquizofrênica que fosse, de retribuir.

- O problema é que isso sequer pode ser considerado uma despedida. Não te vejo e não nos falamos há mais de um ano, certeza que por causa da doença.

- E não fazendo mais parte da minha vida, deveria não fazer parte de minha morte.

- Não é assim que funciona com os bons amigos.

- Não é assim que funciona nossa amizade. A viadice fica por minha conta, mesmo quando só você restou. Agora, antes que eu vá de vez, não tem nada mesmo a dizer?

- Obrigado.

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